Adotar ou não uma carteira
de identidade especial para o autista foi o assunto debatido em
audiência pública nesta quinta-feira (7), no Plenário Rui Barbosa. O
documento com a identificação do autista é proposto pelo Projeto de Lei
(PL) 674/2019, de autoria do deputado Gandini (Cidadania), presidente da
Comissão de Constituição e Justiça, promotora da reunião.
O advogado Dênis Rangel Moraes, pai de autista e membro do grupo de
Apoio aos Pais de Autista Força Azul, defendeu a instituição da
identificação especial. “Facilita a questão operacional, numa fila de
atendimento, para dar atendimento preferencial”, exemplificou.
Porém Moraes sugeriu que a virtual norma contenha mecanismos para que o
pai de autista tenha como e onde recorrer se a documentação especial for
recusada em quaisquer circunstâncias.
Bárbara Campos Fernandes, também membro do grupo Força Azul, mãe de duas
crianças autistas gêmeas, informou que tem pai que espera cinco anos
para ter seu filho atendido por um especialista. “Quando a gente fala
dessa carteirinha, falamos de não passar por estresses em várias
situações. Para nós isso é cansativo. Nossa luta contra o preconceito é
diário”.
Para Bárbara a carteirinha vai auxiliar os pais no dia a dia. Ela citou
casos em que um segurança de um shopping aborda crianças que estão em
“estado de autorregulação”, como correr em volta de uma mesa seguida
vezes, deitar-se no chão em qualquer lugar e outras situações de surtos
consideradas inusitadas em diversos ambientes.
A psicanalista Keli Cristina Ferreira Lopes propôs que seja reconstruído
o conceito de acessibilidade, que não seria apenas os físicos, como uma
rampa de acesso. É preciso que a pessoa com deficiência se sinta
incluída na sociedade, em todos os segmentos.
Ela também defendeu a instituição da carteirinha com argumento de que o
autista passa por constrangimento em seu cotidiano e uma identificação
especial ajuda a pessoa com TEA. “No futuro, teremos uma sociedade
autista. O que é ser normal?”, indagou a psicanalista.
O professor de agronomia da Ufes, Marcelo Suzart de Almeida, pai de
criança autista, considerou que os direitos de todos são iguais, mas as
pessoas são diferentes, com deficiência ou não. Entretanto, seria
necessário algum tipo de identificação para aquelas com deficiência,
pois a lei da acessibilidade não garante, por si só, o acesso. Por isso,
a identificação é necessária pelo alto índice de pessoas autistas na
sociedade.
Marcelo Bózio, pai de criança com deficiência visual, considerou que a
iniciativa é válida, trata-se de um direito dos pais. “Se o cidadão vai
querer ou não a identificação é direito dele”, argumentou. Marcelo
exemplificou o símbolo de cadeirante no estacionamento, que provoca
indignação, pois não dá pra saber se a pessoa que utilizou o espaço tem
outro tipo de deficiência que não necessita de cadeira. Ele sugeriu que
se faça uma campanha de esclarecimento sobre o uso da possível carteira
de identificação do autista.
CONTRA A CARTEIRINHA
Luciamara Martins, coordenadora do coletivo Mães Eficientes Somos Nós,
afirmou que a carteirinha é segregatória, pois se os poderes públicos
aplicassem as leis existentes e se a sociedade tivesse consciência não
haveria discriminação e exclusão.
“Não sou a favor de uma lei de carteira de pessoa autista, pois ela já é
uma pessoa com deficiência. Nós precisamos de conscientização da
sociedade. Precisamos que as leis sejam cumpridas”. Ela defendeu que
seja colocada na Carteira de Identidade a expressão “pessoa com
deficiência”.
Luciamara concordou com os relatos feitos sobre a realidade da pessoa
autista no dia a dia, mas assegurou que essa realidade é de todas as
pessoas com deficiência, por isso defende que é necessária uma
identificação geral e não particular de determinado diagnóstico.
A psicanalista Fernanda Zimmer, do grupo Programa de
Investigação Psicanalística do Autismo (Pipa e Rabiola), disse que ficou
inquieta com a ausência de educadores no debate. Além disso, afirmou
que “não conjuga muito com essa ideia da carteira de identidade. Temos
registro de relatos que a identificação não é tão benéfica. É um marco
muito delicado, precisamos debater o assunto”. Ela reforçou que é
preciso pensar numa linha de cuidado para superar a exclusão.
A psicóloga e psicanalista Juliana Moisés Vieira, também participante do
grupo Pipa e Rabiola, também questionou a medida. “Nós temos que ser
reconhecidos pelas nossas diferenças e não sermos identificados”,
defendeu. De acordo com ela, é preciso trabalhar com as particularidades
de cada autista para que ela se sinta aceita pela sociedade.
Marco Antônio, pai de sete autistas, sugere que a Ales faça uma enquete
na sociedade se aceita ou não uma carteirinha para identificar o
autista. O mais importante é que as pessoas entendam a situação do
autista e de outras pessoas com deficiência.
Giovana de Oliveira, mãe de autista, destacou que a segregação é a
palavra que melhor define a situação das pessoas com autismo, e
considerou que a carteirinha vai reforçar essa condição. “O que
precisamos para nossos filhos é um psicólogo, um pediatra, um
atendimento próprio para eles, não uma simples carteirinha”, disse.
Franciene Rodrigues, mãe de criança com três tipos de deficiência,
pergunta se seu filho vai ter de ter três tipos de carteirinha. Ela
ressaltou que é preciso que os poderes públicos apliquem as leis. A
mesma opinião foi expressa por Tamires Rosa ao considerar que a
carteirinha é excludente.
AUTOR
O deputado Gandini argumentou que, diante das diferenças de opinião a
respeito da instituição da carteira de identidade especial para autista,
o projeto de lei será melhorado, recebendo alterações, e reafirma que o
documento vai ajudar em situações cotidianas.
O deputado concordou que essa não é o principal problema e a principal
discussão acerca das pessoas com deficiência, pois faltam especialistas
para atendimento à demanda no Estado. Ele concordou que faltam médicos
neuropediatras e outras especialidades voltadas para essa população e
informou que esse debate está se dando na Casa em outros espaços.
Fonte: Ales
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