“Foi uma grande farsa montada pelo ex-governador
Paulo Hartung (PMDB) sobre o crime do juiz Alexandre. Agora está nas mãos da Procuradoria da
República esclarecer os fatos”, disse Antônio Franklin da Cunha
Foto: Fábio NunesJuiz Alexandre Martins, foi assassinado em Vila Velha |
A procuradora federal Denise Neves Abade ouviu nessa quarta-feira (21) o
juiz aposentado Antônio Franklin da Cunha e os coronéis da reserva da
PM Luiz Sérgio Aurich e Carlos Augusto de Oliveira Ribeiro. As oitivas,
que aconteceram na Associação de Mães e Famílias Vítimas de Violência
(Amafavv), no Centro de Vitória, fazem parte da instrução da
Procuradoria Geral da República (PGR), que analisa o pedido de
deslocamento de competência do crime do juiz Alexandre de Castro Martins
Filho, assassinado em março de 2003, em Vila Velha. O pedido de
federalização do crime foi feito, em 2011, pela presidente da Amafavv,
Maria das Graças Nacort.
Durante mais de três horas, e às escuras — já que as salas que abrigam a
ONG, no Edifício Martinho de Freitas, ficaram “misteriosamente” sem
energia —, a procuradora federal colheu as versões dos três sobre o
crime do juiz. Os dois coronéis e o juiz aposentado foram consensuais em
um ponto: o juiz Alexandre Martins não foi vítima de crime de mando, e
sim de um latrocínio — assalto seguido de morte.
Ao final das oitivas, os coronéis preferiram não se pronunciar sobre
seus depoimentos, que não pôde ser acompanhado pela imprensa, mas o juiz
aposentado Antônio Franklin da Cunha falou com exclusividade à
reportagem de Século Diário. Ele destacou alguns trechos do depoimento.
“Vim aqui com o compromisso de dizer a verdade sobre a morte do juiz. É
simples, expliquei à procuradora federal, não há como admitir que esse
crime foi de mando. Foi uma grande farsa montada pelo ex-governador
Paulo Hartung (PMDB). Agora está nas mãos da Procuradoria Geral da República
esclarecer os fatos”, afirmou.
Antônio Franklin disse à procuradora que o ex-governador tramou a farsa
com a intenção de tirar vantagens políticas do episódio. Segundo o juiz
aposentado, consolidando a tese de mando, Hartung queria convencer a
sociedade de que ele era homem que acabou com o crime organizado no
Espírito Santo.
“Perceba que Hartung está fazendo a campanha ao governo dizendo que foi
ele quem acabou com o crime organizado”, afirmou Antônio Franklin.
O juiz aposentado disse que a tese de mando forjada por Hartung
tornou-se “verdade” com a ajuda da imprensa. “A imprensa capixaba não
publicou, na época, outra versão que não fosse o crime de mando. Se a
imprensa contrariasse essa tese, Hartung simplesmente cortaria a
publicidade dessas empresas de comunicação”.
Durante seu depoimento à procuradora, Antônio Franklin deu detalhes
sobre o passo a passo do crime. Ele destacou evidências que desconstroem
o crime de mando e atestam que o assassinato do juiz Alexandre foi um
estúpido latrocínio.
À época do crime, Antônio Franklin foi contratado pela Associação de
Magistrados do Espírito Santo (Amages) para atuar como assistente de
acusação no processo. Mas ele decidiu sair do caso quando chegou à
conclusão de que a tese de mando era uma farsa.
Antônio Franklin fez questão de devolver à Amages o dinheiro que
recebera para atuar como assistente de acusação no caso, para não fazer
parte da armação que estava sendo forjada.
NOVOS DEPOIMENTOS
A procuradora federal Denise Neves Abade se recusou a dar detalhes
sobre as oitivas. Ela explicou que não tem autorização da PGR para se
pronunciar. A procuradora disse que veio ao Estado com a missão de
colher declarações que vão orientar a instrução da federalização do
crime, que ela prefere chamar de “incidente de deslocamento de
competência”.
Ela acrescentou que sua função é técnica, e que não lhe cabe emitir
opinião sobre os depoimentos colhidos. O juiz aposentado Antônio
Franklin disse que foi positiva a vinda da procuradora ao Estado. “Após a
instrução, a procuradora vai dar o parecer dela e a PGR vai decidir se
federaliza ou não o crime. Acho que ela ficou convencida do que ouviu
hoje”, opinou o juiz aposentado.
A procuradora explicou que após finalizar as oitivas encaminhará um
parecer ao procurador Geral da República Rodrigo Janot, que vai decidir
se pede ou não o deslocamento de competência para a esfera federal.
“Caberá aos 11 ministros do STJ [Superior Tribunal de Justiça] julgar o
pedido da PGR”. Denise Abade lembrou que em alguns casos a PGR tem dado
parecer favorável ao deslocamento de competência, mas também tem negado
muitos pedidos. Ela citou o caso do assassinato brutal da missionária
americana Dorothy Stang, no Pará, que foi negado pelo STJ.
Ela explicou que a Constituição prevê o deslocamento de competência nos
casos de omissão por parte das autoridades estaduais ou violação aos
direitos humanos. “No caso do Espírito Santo, estamos investigando
supostas denúncias de violação aos direitos humanos no decorrer do
processo”, finalizou.
Há informações não oficiais de que nesta quinta-feira (21) a
procuradora ouça o Odessi Martins da Silva, o Lumbrigão. Em setembro de
2004, Lumbrigão e Giliardi Ferreira foram condenados a 23 anos de prisão
pelo assassinato do juiz Alexandre. Giliardi ganhou progressão de
regime em 2010. Lumbrigão, que teve pedido de progressão negado,
permanece preso na Penitenciária de Segurança Máxima de Viana.
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